Minha jornada combatendo o apodrecimento cerebral

08/09/2025
Colagem de um cérebro estilizado em tons de lilás e rosa dentro de uma moldura de publicação do Instagram, feita pelo usuário 'getalife!!!'. A descrição da publicação é 'stop scrolling...' e foi curtida por 'your.brain' e seus neurônios. Por trás da moldura, está um texto em binário.
Colagem feita por mim

Muito se falou há uns meses no quanto 2024 foi o ano do derretimento e apodrecimento dos nossos cérebros, o famoso brain rotting, graças ao uso intensivo de meios digitais e consumo de conteúdos rápidos, bobos, que não precisam de grandes raciocínios para entender.

Isso já é um tópico que falei há anos aqui no blog (será que sou monotemática?), e, a cada mês que se passa, percebo que é difícil fugir, e, agora com o avanço da IA, temos o que chamam de AI slop, conteúdos preguiçosos gerados sem intervenção humana ou capricho.

Confesso que, embora eu tenha criticado esse uso indiscriminado das redes e a maneira com que elas são parte crucial da vida de muita gente, foi só no ano passado que fui tomar medidas drásticas para reduzir meu uso delas, com temporizadores e muito autocontrole. O que significa que havia todo um estrago de anos anteriores para consertar.

Digo estrago, pois tinha o costume de salvar conteúdos quase que compulsivamente. Pensava que, como ia ter tempo livre quando me formasse, poderia guardar quase tudo para assistir mais tarde, ler mais tarde, consumir mais tarde. E, bem, agora que praticamente já não acumulo mais coisas, decidi passar pelas que estavam guardadas, organizar, e, principalmente, entender um pouco mais sobre mim.

Ou seja, essa é minha história combatendo o apodrecimento cerebral e lidando com mais de mil e setecentos vídeos na lista para assistir mais tarde, mais de mil favoritos no navegador, quase 5 mil pins bagunçados no Pinterest, e sabe-se lá quantos salvos no Instagram, sendo a maioria os terríveis vídeos curtos.

O desejo por imediatismo

Uma das coisas mais interessantes desse processo de limpeza e minimalismo digital foi perceber que eu já tinha coisas acumuladas desde 2020, ou seja, desde antes de começar a faculdade e bem antes de começar a trabalhar. Céus, eu tinha tempo livre, literalmente fazendo nada, então por que diabos tinha que salvar para mais tarde?

Depois de um tempo refletindo e tentando lembrar meus pensamentos de cinco anos atrás, veio a realização de que eu me sentia muito sobrecarregada com o tempo livre, ansiosa com a pandemia e com o fato de não ter minha própria renda. Queria aproveitar esse tempo forçadamente livre para fazer tudo que achava legal, ao mesmo tempo que me sentia ruim em várias coisas.

Mas é claro que eu ia ser ruim, eu nunca acerto de primeira! Mas eu queria acertar, afinal, tantas coisas parecem caber em um vídeo de 30 segundos e eu passava, no mínimo, 30 horas fazendo. Eu, que antes desenhava em qualquer cantinho da folha do caderno, que tinha várias ideias de escrita, fui parando aos poucos, pois comecei a me comparar demais.

Com isso, comecei a rolar telas, assistir vídeos curtos, testar vários jogos, me inteirar de fofocas bizarras do Twitter, e, principalmente, mergulhar em sentimentos que antes eu não entendia, mas que agora sei que eram causados pela comparação com gente que possuía muito mais estudo, paciência, condições financeiras e psicológicas que eu possuo.

Graças a esses hábitos, tive a infelicidade de desenvolver uma nojenta falta de foco, afinal, esse mundo digital no qual entrei tinha um ritmo totalmente distinto do que vivia antes da pandemia. Inclusive, existem vários estudos sobre isso, que valem totalmente a pesquisa. Passei muito tempo incapaz de ler um livro completo sem sofrer, e conteúdos longos foram, aos poucos, saindo da minha rotina, o que estou tentando consertar agora.

Romantizar a vida é difícil para mim

Para completar o cenário caótico dos anos de pandemia e incerteza, eu procurava algo para romantizar a minha vida, sentimento que cresceu depois que comecei a faculdade e percebi o quão difíceis eram as disciplinas. Até hoje não consegui romantizar nada por mais de duas semanas, e isso talvez diga bastante sobre mim (ou não.)

Uma parte gigantesca das coisas salvas que possuo são tutoriais e inspirações. Tanta coisa que já quis tentar na esperança de que fosse virar uma chavinha no meu cérebro e ser o melhor hobby, a atividade suprema (preferencialmente artística) que me faria me sentir viva, que não me desse esse medo de errar, de fazer mal feito.

Com essa eterna busca e pouca a nenhuma execução, não consegui um quarto esteticamente agradável como os que salvava, nem um PC organizado e minimalista (estou no processo!), nem um hobby inspirador, nem uma dieta perfeita, nem uma rotina de exercícios... e por aí vai.

A minha sorte, e sou muito grata por isso, foi que, mesmo não estando inspirada na maioria dos dias, eu fui fundo na graduação, no estágio, no trabalho, e, agora, consigo pensar sem culpa nas tarefas secundárias. Tenho muita coisa acumulada, mas, ao menos uma vez por mês, me permito assistir a um filme ou ler uma webtoon sem pensar que poderia estar estudando em vez de me divertindo.

Nesse processo, além de ter criado a lista de filmes para assistir, feito uma melhor curadoria das coisas que quero ler, conhecido várias bandas e artistas novos, consegui, finalmente, ir me entendendo melhor e separando o que queria por influência externa e o que, de fato, faz sentido para mim.

Continuo sem hobby para romantizar a vida, e devo continuar por um tempo até, de fato, conseguir destrinchar o que gosto de fazer. Pode ser que demore, mas, ao menos, pude começar a tomar atitudes para resolver o problema em vez de só saber que ele existe.

O auge do vício

O momento onde eu realmente fiquei aliviada por ter decidido me policiar foi quando comecei a encontrar Reels de música salvos porque eu não quis parar de rolar o feed por 4 minutos para ouvir a canção por completo. Porque, obviamente, a música não daria a mesma dopamina que ficar esperando pelo próximo conteúdo bobinho na minha tela.

Como alguém que tentou fazer conteúdo pro TikTok por um tempo, devo dizer: vídeo curto é, quase sempre, mais um problema que entretenimento genuíno. A maioria deles têm essa fórmula onde tudo é muito agitado para capturar (e manter) sua atenção, com as famosas armadilhas para atrair comentários, sejam de raiva, de pena, de curiosidade, não importa, desde que tragam engajamentos.

D Black cantou, anos atrás, que um minuto é muito pouco para poder falar, e ele estava certo, e acrescento que 30 segundos é muito pouco para trazer ideias com clareza, e me assusta o quão impressionáveis e ingênuos muitos de nós estamos ficando. Acho que estamos vivendo uma época bem triste, onde muitas opiniões rasas são dadas, muita desinformação é compartilhada, inclusive por gente que se intitula especialista do assunto, e mais e mais a população geral se sente presa a esse ciclo de consumo massivo e sem questionar.

E eu estive aí, facilmente impactada por algumas ideias, sem refletir muito sobre elas, salvando tudo, tentando absorver tudo e estando constantemente estressada e de cabeça cheia. Como já falei, me sentia encantada pela aparência, pela expectativa, pela fantasia de como deveria ser, mas nunca pela execução.

E, agora, parando para lembrar, devo dizer que foram anos tristes.

Minhas soluções para o problema

Eu acho “solução” uma palavra tendenciosa, afinal, não foram essas coisas sozinhas que me fizeram dar uma boa trégua nesse consumo desenfreado, e, sim, um conjunto de pequenas ações. A primeira delas foi, obviamente, reconhecer o problema e não normalizar isso.

Olhar o número de horas que eu passava nas telas para além do trabalho e dos estudos começou a me deixar preocupada, especialmente porque boa parte delas eram passadas já na cama, antes de dormir, ou logo assim que acordava. Isso, somado ao estresse e frustração que sentia, principalmente após alguns momentos delicados, foi suficiente para começar a me limitar.

Desinstalei de vez o Instagram e o YouTube do celular, tendo ainda limpado o histórico e pausado para não ter mais recomendações de Shorts. Com o uBlock no Firefox, eu consegui esconder a opção de Reels do menu do Instagram para evitar consumir vídeos curtos e copiei o filtro para colocar no celular, também.

Além disso, instalei a extensão de navegador Leechblock para colocar limites nas redes sociais, e defini 15 minutos a cada 2 horas. No começo foi difícil, mas depois fui me acostumando.

Claro que largar as telas ainda vai ser difícil para mim, mas, em vez de ficar me culpando, decidi construir hábitos melhores na frente delas enquanto ainda não consigo me desligar: estou com bastante ânimo em escrever todos os dias no diário, em anotar ideias de histórias, conhecer novos grupos musicais, ler artigos longos em blogs, e, claro, organizar minha bagunça enquanto vou revendo meus pequenos sonhos e vendo o que ainda faz sentido realizar.

Quebrar costumes de anos nunca é uma tarefa fácil, mas é mais difícil ainda ficar presa nessa rotina diária de acordar, ficar nas telas, trabalhar, estudar, voltar pras telas, dormir. E eu decidi encarar esse desafio, em alguns aspectos estou vencendo, em outros, ainda estou batalhando, mas o importante é saber que eu comecei.

Espero que esse texto ajude a despertar novas ideias e reflexões!

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